- Há motivos para Paulo Rabello de Castro não presidir o IBGE?
Não temos nada pessoal contra o Sr. Paulo. O que precisamos compreender e o seguinte:
É vedada ao servidor público federal ser proprietário de empresa privada, conforme o inciso X do Art. 117 da lei 8.112/90: “ao servidor é proibido:(…) X – participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário;” (Redação dada pela Lei nº 11.784, de 2008).
Embora não possa participar em sociedade privada exercendo a gerência ou a administração, assim como exercendo o comércio, pode figurar como acionista, cotista ou comanditário da sociedade.
O senhor Paulo Rabello é dono da RC Consultoria, fundador e presidente da SR Rating, e consultor técnico da Fiesp. Como podemos observar ele é empresário e ligado ao setor empresarial.
- O que é, e por que há conflito de interesses?
Conflito de interesses não é apenas um conceito, mas situação regulamentada pela Lei n° 12.813/13 (http://goo.gl/kVUwdC), que dispõe sobre situações de conflito de interesse envolvendo ocupantes de cargo público. Em seu artigo 3º, considera conflito de interesses: “a situação gerada pelo confronto entre interesses públicos e privados, que possa comprometer o interesse coletivo ou influenciar, de maneira imprópria, o desempenho da função pública”. Explica neste mesmo artigo também que informação privilegiada é a que diz respeito a assuntos sigilosos ou aquela relevante ao processo de decisão no âmbito do Poder Executivo federal que tenha repercussão econômica ou financeira e que não seja de amplo conhecimento público. No artigo 4º a lei impõe que o ocupante de cargo público deve agir de modo a prevenir ou impedir possível conflito de interesse e a resguardar a informação privilegiada. E que “A ocorrência de conflito de interesses independe da existência de lesão ao patrimônio público, bem como do recebimento de qualquer vantagem ou ganho pelo agente público ou por terceiro. ”
A Controladoria Geral da União (CGU) elaborou documento de perguntas e respostas para facilitar a compreensão da lei: http://goo.gl/6H7a1R.
- O que são os Princípios Fundamentais de Estatísticas Oficiais?
O IBGE segue os Princípios Fundamentais de Estatísticas Oficiais (http://goo.gl/V4VrSP), adotados pela Sessão Especial da Comissão de Estatística das Nações Unidas (abril/1994). O princípio da Relevância, imparcialidade e igualdade de acesso, já descreve no campo das orientações internacionais que pautam institutos de estatística, um princípio necessário para sua credibilidade:
“As estatísticas oficiais constituem um elemento indispensável no sistema de informação de uma sociedade democrática, oferecendo ao governo, à economia e ao público dados sobre a situação econômica, demográfica social e ambiental. Com esta finalidade, os órgãos oficiais de estatística devem produzir e divulgar, de forma imparcial, estatísticas de utilidade prática comprovada, para honrar o direito do cidadão à informação pública.”
Imparcialidade é dar acesso a todas as informações ao mesmo tempo para todos os usuários (igualdade de acesso e simultaneidade na disseminação), não podendo pairar dúvidas sobre o acesso privilegiado de informações por representantes do mercado privado.
- Mas então a ASSIBGE-SN está defendendo a permanência de Wasmália Bivar?
Nestes seis anos de gestão da presidente Wasmália Bivar, a ASSIBGE-SB fez duras críticas ao seu modelo de gestão. Tanto a gestão de Eduardo Nunes quanto a de Wasmália colaboraram para a precarização do trabalho no IBGE, que, dentre outras coisas, leva a que tenhamos hoje mais trabalhadores temporários do que efetivos. Isso porque as duas gestões definiram que a coleta das informações deveria ser feita por trabalhadores temporários e, mesmo o governo Federal abrindo os concursos, ambos os presidentes não pediram as quantidades de vagas necessárias.
A gestão Nunes pediu poucas vagas para concursos de nível superior e para nível intermediário em 2006, (650, mais os 50%), mesmo após quase 20 anos sem entrar ninguém no órgão. Destes, aproximadamente 25% pediram exoneração. A direção queria colocar servidores de nível superior nas agências e intensificar a contratação e utilização de servidores temporários, chegando a dizer que teriam se arrependido de fazer esse concurso de nível intermediário.
Quando Wasmália assume em 2010, já era diretora de pesquisa e corroborou parte das decisões anteriores, e somente por pressão das lutas de 2012, resolve fazer pedido para concurso de nível médio de forma tímida (1600 vagas ao longo de quatro anos). O mal dimensionamento do crescimento das aposentadorias levou a um decrescimento progressivo da força de trabalho concursada, o que fez o órgão passar por dificuldades de recursos humanos.
Essas gestões priorizaram o controle das pessoas (vide catraca) e não o bem-estar. O treinamento e a capacitação, cada dia mais virtuais, não respondeu às necessidades de ter trabalhadores temporários chegando a cada dia, nem do corpo efetivo. Além disso, o posicionamento público da direção foi tímido em relação à limitação orçamentária recursos e a necessidade de concursos no período mais difícil da crise institucional.
Cumpre lembrar que Wasmália fez uma política antissindical desde o fim da greve 2014, quando demitiu cerca de 180 trabalhadores temporários. Não cumpriu acordo de greve mantendo desnecessariamente a compensação de horas mesmo após todo trabalho ter sido reposto, restringiu as assembleias ao horário de almoço, vigiou os posicionamentos de servidores em perfis nas redes sociais, abrindo processo na Justiça ou praticando assédio a diretor de sindicato que criticava precarização.
Por todos esses e mais outros componentes, não defendemos sua permanência.
- Então o que vocês estão defendendo?
A ASSIBGE-SN defende um IBGE com cada vez mais autonomia técnica e democracia. Queremos eleger os dirigentes do IBGE com mandato fixo, e realizar congresso institucional para definir o planejamento do IBGE. Hoje esse planejamento é feito por grupos seletos de pessoas e não existe a participação dos servidores da casa e muito menos dos usuários, conselhos, universidades e movimentos sociais que podem demandar pesquisas importantes para a sociedade brasileira.
Tanto eleição direta como congressos institucionais são realidade em alguns órgãos públicos a exemplo de universidades, Fiocruz e CNPq, e podem se tornar realidade no IBGE. Esta prática democrática torna-se imprescindível no momento atual em que o aumento das aposentadorias, a entrada de novos servidores e o crescimento do número de trabalhadores temporários ameaça a reprodução permanente da cultura institucional construída com credibilidade por gerações de servidores ao longo dos 80 anos de história do instituto.
- Mas como se implantariam as eleições diretas e o congresso institucional
Através de uma negociação com o governo. Afinal, um órgão de estatística precisa gozar de muita credibilidade e autonomia técnica para desenvolver seu trabalho.
Então, ao invés do governo definir pessoas por partidos que compõem as alianças ou por qualquer outra força da base de sustentação política de um governo, muito melhor seria se os servidores definissem quem é o presidente do órgão, com mandato por tempo determinado.
- Por que a ASSIBGE-SN está criticando o governo Temer e criticou o governo Dilma, o governo Lula, o governo FHC, o governo Collor, etc.? Vocês criticam todo mundo? Ninguém serve?
O que precisa ficar claro é que o sindicato é uma entidade de representação da classe trabalhadora e que deve ser independente de qualquer governo. Por isso, em todos eles organizamos a luta, mobilizamos a categoria, fizemos greves. O objetivo é sempre o mesmo: a defesa dos interesses dos trabalhadores.
Nosso sindicato tem 32 anos de luta na defesa do serviço público e dos servidores.
Mas a ASSIBGE-SN também tem princípios de lutar por uma sociedade justa e, claro, somos contra a concepção de mundo neoliberal, pois ela favorece a concentração de poder econômico e político, aprofundando a desigualdade, como até mesmo o FMI recentemente teve de reconhecer (http://goo.gl/OyswHr).
Agora, por exemplo, o governo fala em reforma trabalhista e previdenciária para retirar direitos, e nossa entidade precisa se posicionar contra essas medidas, assim como se posiciona favoravelmente à necessidade de se auditar a dívida pública brasileira com participação cidadã. Quando jornalistas, economistas ou qualquer setor ataca os trabalhadores precisamos reagir, nos posicionar, organizar a luta, e sermos solidários com os setores atacados.
A ASSIBGE-SN também lutou pelo fim da ditadura militar, que significava não discutir política, não organizar e ser criminalizado por ser crítico. Portanto, a ASSIBGE-SN também defende princípios e valores democráticos, pois custou muito reconstruir a democracia, seja no IBGE ou no país, e entendemos que esses são valores caros.
- O que é Estado Mínimo?
“Concepção fundada nos pressupostos da reação conservadora que deu origem ao neoliberalismo. A ideia de Estado Mínimo pressupõe um deslocamento das atribuições do Estado perante a economia e a sociedade. Preconiza-se a não-intervenção, e este afastamento em prol da liberdade individual e da competição entre os agentes econômicos, que, segundo esta concepção, seria a única forma de regulação econômica, devendo ser feita pelas forças do mercado, as mais racionais e eficientes possíveis. Ao Estado Mínimo cabe garantir a ordem, a legalidade e concentrar seu papel executivo naqueles serviços mínimos necessários para tanto: policiamento, forças armadas, poderes executivo, legislativo e judiciário etc. Abrindo mão, portanto, de toda e qualquer forma de atuação econômica direta, como é o caso das empresas estatais. A concepção de Estado mínimo surge como reação ao padrão de acumulação vigente durante grande parte do século XX, em que o Estado financiava não só a acumulação do capital, mas também a reprodução da força de trabalho, via políticas sociais. Na medida em que este Estado deixa de financiar esta última, torna-se, ele próprio, “máximo” para o capital. O suporte do fundo público (estatal) ao capital não só não deixa de ser aporte necessário ao processo de acumulação, como também ele se maximiza diante das necessidades cada vez mais exigentes do capital financeiro internacional” (retirado do link: http://goo.gl/tUiDcl)
Para o IBGE, a aplicação de uma concepção de Estado Mínimo seria intensificar o que já está sendo feito com redução do quadro de pessoal e substituição por trabalhadores temporários, falta de recursos públicos próprios e até captação de recursos na iniciativa privada, terceirização e privatização.
- Por que nos referimos a Paulo Rabello de Castro como um “Chicago Boy”?
“Chicago boys” foi a denominação atribuída a 25 jovens economistas que, a partir da pós-graduação na Escola de Chicago, desenvolveram o plano econômico para o governo Pinochet, no Chile, após o golpe de Estado que depôs o governo eleito de Salvador Allende. Foi a primeira experiência reconhecidamente neoliberal, antecipando em quase duas décadas a concepção de sociedade que se generalizou a partir dos governos de Margareth Tatcher, na Inglaterra, e Ronald Reagan, nos EUA.
Paulo Rabello de Castro é da escola de Chicago, assim como o ex-ministro Levy e tem concepção de reduzir Estado e investimentos públicos.
- Mas não seria melhor não bater de frente com Paulo Rabello e dar uma chance? Quem sabe ele consegue o plano de carreira, liberdade sindical, etc.?
O que está em jogo é um plano para a estrutura do IBGE e sua função, transforma-lo num órgão gerido e pensado da perspectiva do mercado. Tal como Simon Schwartzman pensou o IBGE – enxuto e sem estar presente em todo o Brasil, realizando pesquisas somente amostrais, e com corpo funcional reduzido -, Paulo Rabello não vem para o IBGE à toa. O presidente indicado, além de representante dos interesses dos grandes empresários, é um dos representantes do pensamento neoliberal no País, que prega o estado mínimo, e com isso o enfraquecimento do serviço público como um todo. Tais ideias, aplicadas ao IBGE, tenderão a acelerar o processo de precarização.
É o que o indicado defende em diversos textos e vídeos disponíveis na internet. A título de exemplo, cita-se o livro “O Mito do Governo Grátis” e uma entrevista no Programa Roda Viva (TV Cultura) em junho de 2015, havendo também inúmeros artigos, onde defende o orçamento de base zero
. No IBGE, Paulo Rabello (indicado de Meirelles) não virá pensando num órgão cada dia mais público, com recursos e servidores suficientes e com condições propícias para realizar seu trabalho. Pelo contrário, ele vem para aprofundar a lógica de fazer cada vez mais com cada vez menos.
Por isso não podemos neste momento pensar de forma corporativa e pequena. Precisamos pensar nos rumos do IBGE e na sua continuidade como um órgão público, independente e autônomo.
Diante das expectativas que a possibilidade do novo faz surgir, é preciso refletir nas seguintes palavras do filósofo Mario Sergio Cortella: “pode-se argumentar que, felizmente, ainda há muita esperança. Mas, como insistia o inesquecível Paulo Freire, não se pode confundir esperança do verbo esperançar com esperança do verbo esperar. Aliás, uma das coisas mais perniciosas que temos nesse momento é o apodrecimento da esperança; em várias situações as pessoas acham que não tem mais jeito, que não tem alternativa, que a vida é assim mesmo… Violência? O que posso fazer? Espero que termine… Desemprego? O que posso fazer? Espero que resolvam… Fome? O que posso fazer? Espero que impeçam… Corrupção? O que posso fazer? Espero que liquidem… Isso não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo. E, se há algo que Paulo Freire fez o tempo todo, foi incendiar a nossa urgência de esperanças“. (http://goo.gl/zWozcg).
Otávio diz
Como cidadão, vejo essa manifestação sindical como totalmente inapropriada em um momento que o Brasil, país que sempre se pautou por políticas patrimonialistas, através de um Estado grande, elitista, ineficiente e que só protege aos seus, começa a enxergar outros caminhos. Aliás, cabe destacar que o Art. 37 da Constituição Federal, determina princípios norteadores para a administração pública – legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade e eficiência – e que não se encaixam nessa perspectiva conservadora e anti-democrática de Estado máximo, que criou verdadeiras castas com direitos não existentes na iniciativa privada, que emprega a vasta maioria da população economicamente ativa. Por favor, mudem a lente utilizada para interpretar os dados que o IBGE coleta sobre o nosso povo. Tivemos já 516 anos de Estado poderoso, e não dá pra dizer que deu certo.
Ademais, tenham orgulho de ter alguém com a criatividade e a qualidade técnica do Paulo Rabello de Castro na presidência desse órgão tão importante para a nossa gestão. Antes um liberal, ou neo-liberal, do que um neo-dirigista ou um neo-socialista, não é mesmo?
Henrique Acker diz
Otávio, nossa opinião está sintetizada na nota que reproduzimos aqui no Portal do Conselho Federal de Economia, maior entidade representativa dos economistas brasileiros.
VAGNER BRANDÃO DE CARVALHO diz
GOSTARIA MUITO QUE A DIREÇÃO DO IBGE, INCLUINDO O SEU ATUAL PRSEIDENTE, ATENDAM AS NECESSIDADES DOS TRABALHADORES DO IBGE, POIS NÓS ESTAMOS NO AGUARDO NESSE PROJETO DE REVITALIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO, E NO NOSSO PLANO DE CERREIRA, E A VALORIZAÇÃO DO SERVIDOR DA INSTITUIÇÃO E DOS APOSENTADO DO IBGE.
Henrique Acker diz
Vagner, nós também. Inclusive já enviamos ofício à Direção do IBGE solicitando nova reunião para debater o assunto.
Igor Ramon diz
Vejo vocês criticarem tanto a indicação do novo presidente do IBGE. Gostaria de saber por que vocês não utilizam o mesmo empenho para cobrar e pressionar o Ministério do Planejamento a autorizar a nomeação dos novos aprovados, visto que os dois resultados já foram homologados e o IBGE necessita de novos servidores para diminuir a precarização. Não vi nenhum post de vocês nesse sentido. Que atentem para isso!
Mara Cristina viana belchior diz
Não vejo problema nenhum dele ser da iniciativa privada, tem pensamento LIBERAL. Gostaria de ver o País com visão de MERCADO. Sem maquiagem.
Henrique Acker diz
Cara Maria Cristina, nenhum problema se o IBGE fosse uma empresa privada, mas trata-se de um órgão público, cujo principal compromisso é com o conjunto da sociedade, visando ao planejamento de políticas públicas. Além disso, há impedimento legal, pela lei de conflito de interesses.