No encerramento do II Congresso Democrático sobre o IBGE, as delegações e participantes de todo o país reafirmam o acerto da construção de um fórum que reflita a produção dos dados oficiais em tempos de crise, aprofundada pelo golpe de 2016, em particular do IBGE, órgão responsável pelo Sistema Nacional de Informações.
Durante os dias do Congresso participamos de debates riquíssimos com colegas ibgeanos de todo o país e representantes de outras instituições, pesquisadores de diversas áreas do conhecimento e movimentos sociais, todos usuários dos dados que produzimos.
Nos debates ficou evidente a importância do IBGE e das estatísticas públicas como instrumentos fundamentais para identificar as múltiplas demandas e refletir a diversidade e riqueza de nosso país. Só com a força dos dados oficiais é possível conhecer e modificar o Brasil. Todo o planejamento e a tomada de decisões estratégicas dependem dos dados oficiais, inclusive no que tange à definição da legislação necessária para traçar políticas públicas.
Ao contrário do que tentam difundir, não somos uma sociedade de “pobres” e “ricos”, mas uma sociedade de classes, formada por trabalhadores e patrões. É da exploração do trabalho que uma minoria se apropria da riqueza produzida no Brasil. É da herança colonialista que trazemos a concentração da terra, das propriedades urbanas e as chagas do racismo, do machismo e da desvalorização do trabalho, mazelas de um país que ainda não consegue encarar com profundidade suas desigualdades.
Queremos que os nossos povos originários, os povos tradicionais, os nossos sem-terra e sem-teto, os nossos irmãos das periferias e favelas, a juventude, as mulheres, os LGBT, participem da construção de um IBGE democrático, voltado para a maioria da sociedade. Essa democratização deve se estender também na relação com a intelectualidade e com setores da sociedade civil, pouco retratados e, consequentemente, marginalizados pelo poder público.
É fundamental estabelecer uma relação democrática com a imprensa, sem priorizar tal ou qual veículo, oferecendo os resultados das pesquisas que produzimos, sempre acompanhados de uma análise profunda do que eles representam para a sociedade brasileira.
Rejeitamos a tentativa de sucessivos governos de desidratar o IBGE e, por consequência, esvaziar sua capacidade de retratar na plenitude a diversidade da população e do território nacional. Rejeitamos o modelo de austeridade econômica, que aposta no corte dos investimentos públicos, cujo maior exemplo é a EC 95, que impõe um teto de gastos por 20 anos aos serviços públicos, mas que é flexível nas cobranças de dívidas dos grandes empresários e banqueiros.
Bastou um ano de gestão neoliberal explícita dentro do IBGE para sentirmos as consequências deste modelo, esvaziado de conteúdo e inflado de marketing. Ficou evidente que o objetivo desta política é transformar o IBGE em balcão de negócios de pesquisas e produtos para o “mercado”.
Chegou-se ao cúmulo de conceder a medalha Getúlio Vargas – maior comenda oferecida pelo IBGE – ao chefe de um governo ilegítimo, que usurpou o poder. Acreditamos que é papel do Conselho Diretor do IBGE rever a concessão desta medalha, sob a pena de seus membros se desmoralizarem frente ao corpo técnico.
A precarização do trabalho, que se reflete cada vez mais nos dados que coletamos e nas pesquisas que divulgamos, é inadmissível dentro de um órgão produtor de dados oficiais, e coloca em risco a memória institucional e a credibilidade do IBGE.
Ao contrário do que apregoam algumas vozes na sociedade brasileira, estamos convencidos de que a saída para o enfrentamento dos problemas de nosso país passa por mais democracia, mais participação, mais direitos sociais, mais igualdade e liberdade. Nenhuma proposta autoritária, por mais tentadora que seja, pode dar cabo das contradições que vivemos.
Os relatos de experiências de gestão democrática em outras instituições públicas federais, como a Fundação Oswaldo Cruz e a UFRJ, com anos de democracia interna e relações estabelecidas com a sociedade civil organizada, nos mostram que é possível avançar na busca de formas democráticas e participativas de gestão no IBGE, e de uma relação transparente do Instituto com o povo brasileiro.
Estamos convencidos que a democracia precisa de um IBGE cada vez mais forte, atento à diversidade, e de dados oficiais que expressem, de forma detalhada, a realidade brasileira, de seu povo e de seu território. Da mesma forma, estamos convencidos que o IBGE precisa de mais democracia em sua gestão, para dar conta dos desafios de um órgão público que consiga coordenar o Sistema Nacional de Informações, dialogando internamente com seus trabalhadores e com os diversos atores da sociedade, a partir de suas demandas.
Precisamos de mais pessoal no quadro efetivo, através de concursos públicos, não apenas para dar cabo das tarefas do próximo Censo Demográfico, mas também para manter e ampliar as pesquisas contínuas. Não podemos seguir de pires na mão, entra governo sai governo, para fazer o máximo possível com o mínimo necessário. Não se pode admitir como algo natural que tenhamos trabalhadores temporários para atividades contínuas, substituindo os trabalhadores efetivos do IBGE. Não se pode apostar na precarização da força de trabalho e na remuneração indigna.
Necessitamos de um plano de carreiras que assegure a promoção e a progressão a todos os servidores, para que esses possam fazer do seu trabalho no IBGE um projeto de vida. Para isso, é decisivo que os membros do Comitê Gestor de Carreiras, eleitos no início do ano, sejam empossados imediatamente, e que o Comitê volte a se reunir o mais rápido possível.
Qualquer tentativa de rever o marco regulatório que rege as atividades do IBGE deve passar, necessariamente, por um profundo debate interno, bem como com a sociedade organizada, seja através da realização de um Congresso Institucional ou de um evento aos moldes do Congresso Democrático. Chegou a hora de debater o papel do IBGE e das estatísticas oficiais, a partir de novas relações democráticas com os trabalhadores, ouvindo as demandas de nosso povo.
O II Congresso Democrático sobre o IBGE cumpriu a função de pautar a relação entre o Estado e a sociedade, no que tange ao retrato estatístico e geográfico do Brasil. Que ele sirva de estímulo para outros setores e, assim, possamos iniciar um novo ciclo no nosso país. O Brasil que nós queremos é o que se reconheça na realidade dos dados produzidos pelo IBGE, para encontrar soluções para o seu povo no presente e no futuro.
Plenária de Encerramento do II Congresso Democrático sobre o IBGE
Rio de Janeiro, 28 de maio de 2018.
Deixe um comentário
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.