Ao Excelentíssimo Sr. Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro;
Ao Excelentíssimo Sr. Ministro da Economia, Paulo Guedes;
A Sra. Presidente do IBGE, Susana Cordeiro Guerra –
É público e notório o quão graves, duradouros e irreversíveis serão os prejuízos a toda sociedade brasileira, caso sejam levadas adiante as mudanças metodológicas e os cortes no orçamento previstos para a realização do Censo 2020, no formato intervencionista e imediatista como vem sendo feito.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é uma fundação pública, com 83 anos de reconhecimento e confiança institucional, referência com inegável legado na prestação de serviços de interesses nacionais estratégicos. E o Censo é um investimento estratégico para o desenvolvimento nacional, cuja importância ultrapassa a coleta e o armazenamento de dados sobre a população.
Entre as inúmeras aplicações das informações, estimativas e parâmetros resultantes da realização de um Censo, qualificado e bem feito, destacam-se: a utilização dos dados para a alocação dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e dos Estados (FPE); para a distribuição do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB); para o planejamento e elaboração de políticas públicas destinadas a atuar sobre o déficit habitacional, tal como o Programa Minha Casa, Minha Vida; para programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, BPC e outros; para elaboração de leis e programas sociais, bem como para a instituição de marcos e referenciais demográficos, para a construção de escolas, postos de saúde, creches e planejamento urbano; além, é claro, de oferecer projeções demográficas confiáveis, indicadores de desigualdade econômica, desenvolvimento social e monitoramento das políticas públicas, governamentais e de Estado.
No entanto, as mudanças metodológicas impostas – as quais desrespeitam as normativas e regimentos internos – representam uma ruptura e uma intervenção na autonomia e na condução técnica das etapas finais do planejamento do Censo 2020.
As justificativas para os cortes no número de perguntas e no conteúdo dos questionários, apelando para a redução no tempo de entrevista, não se sustentam. Além de representar uma mudança inexpressiva no tempo de leitura do documento, isso sequer terá relevância prática no processo do recenseamento como um todo. O tempo da presença do recenseador dentro da unidade familiar, de deslocamento e o tempo de busca e localização de cada domicílio ultrapassa em muito os quatro minutos presumidos de cada entrevista, alardeados como a “solução milagrosa” para reduzir os custos do Censo 2020.
Outrossim, a diminuição na contratação de recenseadores – de 203 mil para 180 mil – o que ignora o crescimento da população brasileira, que já ultrapassa 210 milhões de brasileiros, demonstram a contradição entre as explicações e as pretensões noticiadas pela Direção de Pesquisa e a Presidência do IBGE. A alegação de otimizar as entrevistas, e cortar recursos e funcionários, claramente, irá afetar os resultados, gerar maior morosidade e elevar os custos do processo de recenseamento.
Além do mais, é um equívoco imaginar que existam sistemas cadastrais e de registros capazes de substituir dados gerados pelo censo. Mesmo com todo o avanço tecnológico, até os dias de hoje, não há integração e nem mesmo um sistema de dados e registros cadastrais confiável capaz de substituir as informações censitárias. Algumas previsões otimistas afirmam que o processo de integração desses sistemas pode levar até uma década. Portanto, seria inviável e reprovável modificar o Censo de 2020 alegando que os dados perdidos poderão ser obtidos por outras fontes.
Perante o que está exposto, os riscos são reais, as perdas de dados são evidentes e os prejuízos às séries históricas com informações demográficas e indicadores socioeconômicos serão injustificáveis.
Com o objetivo de fortalecer a credibilidade da instituição e a independência metodológica, bem como a valorização do quadro técnico do IBGE, esta audiência pública, atividade oficial da Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul que reúne sindicatos, universidades, entidades e movimentos sociais, pesquisadores, deputados estaduais e a comunidade em geral, expressa publicamente a temeridade quanto a interferência na autonomia, a ruptura metodológica e a intervenção na condução técnica de planejamento e desenho do Censo 2020. Esse colegiado também repudia a falta de transparência e diálogo por parte das Direções e da Presidência do IBGE, que, mesmo convidados, não compareceram a esse importante e democrático espaço de discussões públicas.
Portanto, a audiência pública referenda e recomenda: primeiro, a manutenção dos questionários do Censo 2020 no formato original, que vem sendo produzidos pelas equipes e fóruns técnicos desde 2016 e que já passaram pelas provas piloto em 2018 e 2019; segundo, a contratação dos 203 mil recenseadores previstos no planejamento inicial do censo; terceiro, a manutenção do orçamento de R$3,1 bilhões previstos para a realização do censo sem cortes; e, quarto, o encaminhamento e o requerimento formal de um pedido de respostas técnicas e detalhadas para cada alteração realizada nos questionários e na metodologia do Censo 2020.
Por fim, nos colocamos à disposição para dialogar e construir ações e medidas que venham a qualificar o Censo Demográfico e a fortalecer as instituições nacionais voltadas à pesquisa e à estatística, as quais são absolutamente fundamentais para o desenvolvimento nacional.
Porto Alegre/RS, 08 de outubro de 2019.
Referendada em audiência pública presidida pelo deputado Valdeci Oliveira.
Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul
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