Presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) há quatro meses, o carioca Roberto Olinto, de 64 anos, tem pela frente o desafio de conduzir grandes operações no instituto, como a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) e Censo Agro 2017, que entra hoje em fase de coleta. Suas missões mais difíceis, contudo, serão enfrentar o constante enxugamento do quadro funcional e o histórico problema orçamentário.
Em entrevista exclusiva ao Valor, concedida no gabinete da presidência do IBGE, no centro do Rio, Olinto reconhece que o orçamento sempre foi um problema. Depois de garantir recursos necessários para finalizar o Censo Agro em 2018, sua meta agora é convencer o governo e políticos sobre a importância de, em meio à crise fiscal, desembolsar de R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões em cinco anos para a realização de um censo demográfico em 2020.
“Temos pequeno valor no orçamento de 2018 para atividades do Censo 2020, como viagem e seminários. O grupo técnico começa a definir o perfil do censo e isso vai se acelerar até 2020, quando ocorrerá a coleta”, diz Olinto, acrescentando que o Censo Agro é “cafezinho” diante do censo demográfico. “São 26 mil temporários no Censo Agro; no demográfico são 300 mil”.
Segundo ele, os recursos necessários para a realização do censo demográfico não estão garantidos para os próximos anos. Na última quarta-feira, Olinto esteve num evento em Brasília e defendeu, na presença de deputados e senadores, a importância do Censo 2020, desde o interesse de acadêmicos até de prefeitos que precisam atualizar sua população para o Fundo de Participação dos Municípios.
Ele afirma que um atraso na pesquisa, como ocorreu com o Censo Agropecuário (que deveria ter sido realizado em 2015) e com a Pesquisa de Orçamentos Familiares (que deveria ter sido feita em 2014), provocaria descontinuidade estatística e comprometeria outras estatísticas do IBGE. A POF é um dos exemplos mais bem acabados.
“A POF é fundamental para a ponderação do IPCA. O IBGE sempre propõe a realização das pesquisas no prazo, mas precisamos de orçamento. No caso da POF, ela vai aperfeiçoar o índice de preços. Ele hoje está ruim? Claro que não. Mas quanto mais rápido aperfeiçoar a pesquisa, melhor”, diz o presidente do IBGE.
Para resolver a questão, Olinto propõe a criação de um fundo para financiar a produção de estatísticas e informações geocientíficas. A ideia é que o fundo receba, de forma diluída no tempo, recursos para as grandes operações. “Considerando que existe o teto orçamentário, o uso de um fundo seria fundamental”, disse ele, sem especificar, porém, a origem dos recursos do fundo.
Além da realização de pesquisas, o IBGE precisa de recursos para enfrentar outro desafio: o constante enxugamento de seu quadro de servidores permanentes. Em maio deste ano, o instituto foi autorizado pelo Ministério do Planejamento a nomear 300 servidores aprovados no concurso público realizado em 2015. Trata-se de pouco mais da metade dos 530 servidores que se aposentaram neste ano.
Desde 2010, o IBGE perdeu 20% do total de servidores permanentes. São 1.400 trabalhadores a menos. Isto torna-se ainda mais desafiador diante das novas pesquisas criadas ou ampliadas nos últimos anos – como o Índice de Preços ao Produtor (IPP), a Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) e a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Continua).
“O quadro atual é suficiente para não comprometer a qualidade das pesquisas que fazemos, mas para os novos desafios será necessário mais gente”, diz Olinto. “Mas indiscutivelmente precisamos de gente para recompor as aposentadorias, as passadas e as futuras. Hoje eu pediria 1.500 pessoas para começar, no mínimo. É uma questão chave.”
Ao mesmo tempo que busca driblar o “desmonte” do instituto, Olinto quer introduzir novos padrões. Ele revelou que o instituto vai passar a divulgar parte dos resultados de pesquisas não conjunturais antes que elas estejam concluídas e possam ser consideradas “oficiais”. A chamada estatística “experimental” foi aprovada pelo Conselho Diretor do instituto e está em implementação.
Segundo ele, o IBGE vai passar a divulgar os principais números com as pesquisas ainda em curso, sob a condição de que os dados podem passar por revisões e conter erros ainda não identificados por seus técnicos. Ou seja, não são definitivos. Essa espécie de prévia das pesquisas “oficiais”, a ser publicada no site do instituto, representa uma mudança de lógica das divulgações.
“É importante dizer que não vou colocar como experimental estatísticas conjunturais, como PMS, PMC ou PIB. São informações que mexem com mercado. Imagina o caos se o IBGE coloca uma prévia do PIB na internet? Viraria dado oficial em meia hora”, afirma Olinto.
O novo padrão estatístico poderia ser aplicado, por exemplo, no Censo Agro e na Pesquisa Trimestral de Abate. Para o IBGE, o benefício seria oferecer informações de maneira mais rápida. “Além disso, os usuários poderão descobrir coisas que a gente não viu ou levaria mais tempo para descobrir. Estamos pedindo parceria com usuários, trabalharmos juntos os dados”.
A sinalização amigável aos usuários de dados do IBGE – como acadêmicos, organizações internacionais, empresas privadas e consultorias – ocorre após turbulências no início do ano, quando foram feitas mudanças na ponderação e na amostra nas pesquisas mensais de comércio (PAC) e de serviços (PAS), ainda na gestão de Paulo Rabello de Castro no instituto.
Com as alterações metodológicas, as vendas do varejo restrito de janeiro, por exemplo, passaram de uma retração de 0,7% para uma alta de 5,5%. Além da crítica por não ter divulgado e debatido as mudanças com mais antecedência, analistas se queixaram da ausência de dados recalculados das duas pesquisas referentes aos anos anteriores.
Olinto descarta qualquer erro técnico da pesquisa. “Você mudar o encadeamento de uma série sempre terá uma perda, não tem jeito. Eu tenho que melhorar e, para melhorar, eu rompo”. Para ele, o problema foi, na verdade, de comunicação com o mercado. “Tanto que houve uma mudança de rotina. Nós divulgávamos a mudança 30 dias antes. Passamos para 60 dias agora”.
Por Bruno Villas Bôas (Valor Econômico – 2/10/2017)
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