Pesquisa nacional deveria ter sido feita em 2020, mas a realização ainda é incerta e pode ficar para 2022
via: Alma Preta Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões
No Brasil, o último Censo Demográfico foi feito em 2010 e, por lei, deveria ser repetido a cada dez anos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A pesquisa traça o perfil da população e serve de base para a elaboração de políticas públicas para as áreas de saúde, educação, trabalho, moradia, economia, alimentação entre outras.
O governo federal adiou por duas vezes a realização do censo e anunciou cortes significativos no orçamento planejado desde 2015. O censo pesquisa todas as casas dos mais de 5,5 mil municípios do país com um questionário básico e a cada dez residências é feito um questionário de amostra, com mais perguntas.
A previsão de custo do censo 2020 era de R$ 3,1 bilhões e o governo fez um corte de 40%, caindo para R$ 2 bilhões, além de reduzir o número de perguntas. Por exemplo, foi retirada a questão sobre o valor do aluguel, que era importante para o cálculo do déficit habitacional por município. Outra pergunta que saiu era sobre a renda familiar.
“No censo de 2010, essa pergunta foi fundamental para a estratégia dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família. É uma informação importante para se fazer políticas de erradicação da miséria e da pobreza”, explica a economista Dione Oliveira, diretora da Assibge, associação nacional que representa os servidores do IBGE.
Os impasses que o governo coloca para dificultar o censo demográfico, de acordo com a associação, vão além da pandemia e da crise orçamentária. A questão de fundo, neste caso, é a orientação do governo em não criar políticas públicas e programas para combater a desigualdade no Brasil, sobretudo para a população negra.
Na posse da atual presidente Suzana Guerra, em fevereiro de 2019, o ministro da economia Paulo Guedes criticou a quantidade de perguntas previstas para o censo, que foi elaborado e estudado pelo corpo técnico do IBGE. “Ele disse quem pergunta muito descobre o que não quer”, lembra Dione.
Direitos sociais
A falta de informações sobre a realidade brasileira, desde 2010, afeta diretamente a população negra que busca mais direitos sociais. “A desigualdade no Brasil tem cor e é negra. Não ter um censo demográfico é um desastre. O censo de 2020 seria muito importante para saber os avanços e recuos dos últimos 10 anos”, destava Wania Santana, da Coalizão Negra Por Direitos.
Segundo a integrante da organização, que reúne mais de 150 entidades do movimento negro, estatísticas apontam que a população negra teve piora na condição social.
“Os índices de desemprego são maiores entre nós, a precariedade de moradia é pior entre os negros, os recursos para a educação pública são insuficientes. Essas informações do censo são estruturantes e importantes para a nossa agenda de reivindicações para a redução da desigualdade étnico-racial. A luta por um censo sem cortes é fundamental”, reivindica.
Intervenção política
Em maio, a associação de servidores divulgou uma carta pública denunciando a tentativa de intervenção política no censo. Já em dezembro, um núcleo de funcionarios da Assibge lançou um livro sobre os problemas e impactos que podem ser causados pelo adiamento do censo, citando exemplos da Argentina e do Chile.
“Ao censo estão vinculados programas de obrigatoriedade legal como o fundo de participação dos municípios, o fundo de participação dos Estados e a política de cotas. O censo gera um conjunto de informações para que os municípios possam fazer as políticas que são necessárias para atender as necessidades da população”, pondera a economista.
Ainda segundo a associação, o adiamento do censo para 2022 representa um grande risco. O cadastro de endereços e da base territorial, produzido até o final de 2019, ficará desatualizado. Além disso, não há previsão de pré-coleta, operação de atualização feita pelos próprios recenseadores. Serão necessários recursos para atualização cadastral e obsolescência dos equipamentos. Haverá ainda desmobilização das equipes já treinadas.
Outro problema apontado pela Assibge é que o censo pode nem ser concluído ou ter a conclusão prejudicada por falta de funcionários. Os contratos dos analistas censitários encerram em 2022. Não haverá pessoal suficiente para etapas de crítica, apuração e tabulação.
Procurada pela agência Alma Preta, a Casa Civil, pasta responsável pela elaboração das políticas do governo Jair Bolsonaro, foi questionada sobre os cortes no orçamento e o adiamento do Censo 2020, porém não respondeu. O IBGE também não respondeu sobre a alteração na proposta original de perguntas para o censo.
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