Por Luciano Fazio
A Emenda Constitucional nº 103, de 12/11/2019 (EC 103), elevou a idade mínima para a concessão da aposentadoria voluntária do servidor vinculado ao RPPS da União: de 55 anos para os 62 anos, para a mulher (M), e de 60 anos para os 65 anos, para o homem (H). Fixou também regras de transição, com requisitos menos severos para alguns servidores já em atividade, mas tecnicamente questionáveis, como ficará evidente pela crítica à “regra de transição por pontos” (RTP).
A RTP da EC 103 condiciona a aposentadoria do servidor ao cumprimento cumulativo de: idade mínima de 56 anos (M) e 61 anos (H); tempo mínimo de contribuição de 30 anos (M) e 35 anos (H), de serviço público (20 anos) e no cargo (cinco anos); e o somatório da idade e tempo de contribuição equivalente a 86 pontos (M) e 96 pontos (H), acrescido de um ponto a cada ano, até chegar aos cem pontos (M) e aos 105 pontos (H).
Veja dois exemplos da aplicação da regra (em 13/11/2019), considerando — por simplicidade didática — apenas as exigências de idade e tempo de contribuição.
Exemplo do João: 57 anos de idade, 32 anos de contribuição. Antes da EC 103, ele se aposentaria em 2022, três anos mais tarde. A RTP traz mais quatro anos de contribuição, pois os 103 pontos exigidos serão obtidos em 2026, aos 64 anos de idade e 39 de contribuição, mais cedo do que os 65 anos exigidos pela reforma.
Exemplo da Ana: 48 anos de idade e 25 de contribuição. Pela regra anterior, ela se aposentaria em 2026, aos 55 anos e com 32 de contribuição. A RTP lhe exigiu os 99 pontos, ou seja, mais seis anos de contribuição, adiando a aposentadoria para 2032, aos 61 anos de idade e com 38 de contribuição, um ano antes da nova idade mínima.
A RTP aumenta o tempo que falta ao João para se aposentar em 133%, contra os 85% da Ana, apesar de aquele estar mais próximo da concessão do benefício do que esta. A regra desrespeita a expectativa de direitos e também o critério de proporcionalidade.
Veja-se uma proposta de regra de transição alternativa tecnicamente correta, equitativa e que beneficia todos os servidores ativos:
Em lugar de o servidor em atividade na data da reforma ter de completar a nova idade mínima, ele deverá adiar a aposentadoria pelo período calculado pelo aumento da idade mínima proporcionalizado ao tempo que lhe falta para a aposentadoria voluntária.
Por exemplo, se o aumento da idade mínima for de cinco anos, quem já contribuiu 18 dos 30 anos devidos, terá que adiar a aposentadoria em mais 5 x (12/30) = dois anos.
A proposta fica mais clara fazendo a analogia com a compra de um automóvel novo por meio de uma série de prestações antecipadas. Sempre que houver alteração do preço do veículo, as prestações a vencer (o saldo devedor) são corrigidas, mas não as já pagas. A “compra” da aposentadoria segue a mesma lógica da do carro, mas a moeda de pagamento não é o “dinheiro”, e, sim, o “tempo”. Os “aumentos de preço” devem incidir sobre o saldo devedor que, nesse caso, é o tempo que falta para a aposentadoria.
Aplique-se a regra alternativa ao João, a quem faltavam três anos para a aposentadoria, tendo já “quitado” 32 anos dos 35 necessários. O “aumento de preço” da reforma foi de cinco anos (a idade mínima foi de 60 para 65 anos). João deveria ter adiado a aposentadoria em 5 x (3/35) = 0,43 anos (cerca de cinco meses).
Exageradamente, a RTP da EC 103 adia a aposentadoria do João em 48 meses, dez vezes mais do que o período tecnicamente correto (cinco meses). É como cobrar o “aumento de preço” sobre “prestações” já pagas.
Ana “quitou” 23 anos dos 30 exigidos para a aposentadoria. O “saldo devedor” dela é de sete anos. A reforma elevou a idade mínima de 55 para 62 anos. Pela regra alternativa, Ana adiará a aposentadoria em 7 x (7/30) = 1,63 anos, ou cerca de 20 meses, bem menos do que os 72 meses da RTP.
O rigor técnico da regra alternativa aqui proposta desvenda o caráter arbitrário da regra de transição “por pontos” aprovada em 2019. Fornece, ainda, parâmetros quantitativos para identificar e tentar corrigir os equívocos.
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