Vivemos em um período da história caracterizado como “era da informação”. Este novo paradigma técnico-econômico compreende transformações sociais, entre elas técnicas e organizacionais, que têm como “fator chave” a informação, a grande disponibilidade delas é resultado dos avanços das tecnologias da informação e comunicação (TIC). Entretanto, além da redução impactante dos custos de produção e da ampliação da velocidade de transmissão, a característica essencial da informação é a confiabilidade. Essa característica é conferida aos órgãos oficiais de produção de estatística, na medida em que estes compõem a estrutura do Estado, estando pautados por um conjunto de princípios que norteiam a sua atuação, tais como independência, autonomia, transparência, publicidade, comparabilidade internacional entre outros.
O IBGE nasceu em 1936 com a atribuição de organizar e manter os serviços oficiais de estatística e de informações geocientíficas, o órgão também está intrinsecamente ligado à elaboração e execução de planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico social. Essa atividade, quase 90 anos após a fundação do IBGE, nunca foi tão central tendo em vista a necessidade de promover planejamentos e avaliação de políticas públicas em nível nacional e subnacionais que possam contribuir para superar os problemas da nossa sociedade, como a falta de emprego, o nível de (des)industrialização da economia, a carestia, a degradação ambiental, a violência, a fome e a miséria, e para a construção de uma cidadania realmente efetiva. O IBGE é uma instituição de produção de informações científicas, desde sua fundação, o que é reafirmado pela CF 88, as atribuições do IBGE estão mais claramente expressas no artigo 21, inciso XV. Na constituição figuram também diversas áreas nas quais a instituição possui papel fundamental, pois é o órgão que produz os insumos necessários para a implantação de políticas públicas.
Além de caráter científico, o IBGE produz dados para o interesse público que possui usuários em toda sociedade, entre eles: academia, organizações não governamentais, empresas nos mais diversos ramos da sociedade e, principalmente, o Estado utiliza as informações produzidas pelo órgão para gestão de políticas públicas. Assim, as informações produzidas pelo IBGE, como elementos estruturadores de políticas públicas nas diferentes fases (diagnóstico, monitoramento e avaliação de impactos), precisam se adequar em termos de diversidade temática e acompanhar as mudanças que ocorrem na sociedade.
As informações produzidas pelo IBGE, ao longo de sua história, assim, revelaram no passado e continuam demonstrando no presente, que o Brasil é um país desigual em várias dimensões, em termos de renda, sexo, cor ou raça, região e em termos digitais. E, para a constituição de todos os brasileiros como cidadãos, o país necessita da garantia de informações públicas, relevantes, tempestivas, de fácil acesso e com credibilidade. Em tempos de fake news, a garantia dessas informações fidedignas é um dever importante do Estado.
O IBGE que o Brasil precisa é aquele com condições materiais para atendimento das demandas da sociedade, que são crescentes e requerem cada vez mais detalhamento notadamente no âmbito territorial. Então, o órgão precisa estar disponível para realizar as alterações e adaptações necessárias para tal atendimento e contemplar suas mudanças ao longo do tempo. Com o advento da sociedade da informação, pautada no desenvolvimento das TICs, o IBGE foi atravessado por essas inovações. Por ser uma instituição produtora de informações, houve alteração completa dos processos de trabalho, além de terem sido necessárias atualizações metodológicas e a adoção de inovações, que também acompanharam a diversificação das demandas. Apesar do seu desempenho e do seu papel estratégico, o IBGE sofre com a imposição de limites à sua capacidade de produção, ao mesmo tempo em que se ampliam as demandas e os desafios de retratar a realidade brasileira. O rompimento desses limites se dará, em parte, pela imperiosa revogação da Emenda Constitucional 95, que limita os gastos públicos por 20 anos, impondo uma situação de asfixia aos serviços e aos servidores públicos. Além disso, solicitamos do governo eleito um compromisso com o IBGE e com os seus trabalhadores nos seguintes pontos.
1- Concurso público para reposição do quadro de funcionários. A instituição precisa de pessoal qualificado permanente para cumprir sua missão e sofreu na última década redução drástica de seu quadro. Em 2010, o IBGE contava com aproximadamente 7 mil servidores efetivos e, atualmente, possui 4 mil. A direção solicitou autorização para concursar 2500, porém há mais de 7 mil cargos vagos. Atualmente, dos 4 mil servidores efetivos ativos, 24% podem se aposentar a qualquer momento.
Outro ponto se refere ao esvaziamento da rede de coleta. Atualmente, 80% das 570 agências do IBGE possuem somente até 3 servidores efetivos e 20% possuem apenas um efetivo.
Os trabalhadores temporários correspondem a mais de 50% da força de trabalho da instituição. É inevitável que levantamentos esporádicos, como o Censo Demográfico, se apõem em grande parte em pessoal temporário, mas atualmente o IBGE depende completamente de temporários para execução das mais básicas atividades regulares, como as pesquisas permanentes a respeito do mercado de trabalho, índice de preços, atividade econômica, Esses trabalhadores temporários, com baixa remuneração e alta rotatividade, Enfim, todo o retrato da nossa estrutura produtiva que se consolida no sistema de contas nacionais e portanto, no cálculo do PIB e demais agregados econômicos.
O mesmo ocorre com o levantamento de informações geográficas e geológicas – o IBGE depende do pessoal temporário para atualização da Base Territorial, do Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos (CNEFE) e a atualização das informações de geodésia , ou seja, pontos no território com informação de Latitude, Longitude e Altitude.
Além disso, o avanço do programa de trabalho do IBGE – e dos institutos de estatística pelo mundo – está exigindo recursos humanos de alta qualificação que possam desenvolver projetos com uso intensivo de registros administrativos e bigdata e tenham condições de realizar a gestão das relações institucionais com outros órgãos (há como exemplo o projeto dos indicadores de ODS) e informantes. Além do já conhecido intenso trabalho de escritório que a realização desses inquéritos exige na especificação, negociação com os outros órgãos, planejamento, operacionalização, crítica e divulgação . Enfatizando que a contratação de trabalhadores de nível superior tem apresentado percentual crescente no total de efetivos da instituição nos últimos anos.
Assim a realização de concurso para servidores de nível superior e intermediário é condição de sobrevivência do IBGE. Precisamos de trabalhadores para planejar e analisar os levantamentos do IBGE bem como aqueles que conduzirão os trabalhos de campo, realizando os treinamentos necessários, orientando o trabalho imediato da coleta e fazendo o primeiro nível de crítica de consistência de cada pesquisa em todas as agências do IBGE.
2 – Orçamento adequado. O orçamento do IBGE tem sido progressivamente declinante em termos reais. O orçamento previsto na PLOA 2023 para o orçamento regular do IBGE (isto é, exclusive as verbas específicas do Censo Demográfico) é 28% inferior, em termos reais, à dotação prevista na LOA de 2014.
O austericídio está prejudicando o funcionamento cotidiano da Instituição e inviabilizando o planejamento da instituição. No ano corrente, o IBGE tem atrasado pagamento de contas de aluguel, água, luz e de funcionários terceirizados de limpeza.
Em anos recentes, os cortes orçamentários implicaram em adiamentos, suspensão e cancelamentos de uma série de pesquisas essenciais – caso do Censo Agropecuário e a Pesquisa de Orçamento Familiar (realizados com atraso) e da Contagem Populacional de 2015 (cancelada) e de diversos outros levantamentos. O IBGE também depende atualmente de verbas externas, de outros órgãos de governo, para realização de levantamentos temáticos – essa forma de financiamento, de carácter volátil é incompatível com a necessidade de estabilidade para estruturação de um sistema de informações.
É importante ressaltar que a sociedade demanda cada vez mais produção de dados estatísticos e geográficos, implicando a necessidade de ampliação do plano de trabalho do IBGE.
3 – Valorização profissional:
a. nova carreira – sindicato e direção do IBGE acordaram ainda em 2014 uma proposta de reestruturação da carreira. Desde então, não houve nenhum avanço concreto em sua implantação. A reestruturação implica um ambiente de mais estabilidade para fixar novos quadros técnicos e valorizar os quadros sênior;
b. reajuste salarial – os servidores efetivos estão sem reajuste salarial desde 2017, resultado da última negociação salarial de 2015 antes do golpe de 2016. Acumulamos uma perda de 36,7% (IPCA de janeiro de 2017 a outubro 2022);
c. plano de atualização técnica por meio de cursos de qualificação e projetos de cooperação técnica com outras instituições brasileiras e estrangeiras – esses eventos são fundamentais para qualificar os servidores e aumentar a nossa inserção e possibilidade de influenciar o cenário internacional das estatísticas públicas.
d. aumento emergencial da remuneração dos trabalhadores temporários envolvidas nas pesquisas permanentes do IBGE. Eles recebem atualmente R$ 1.387,00. A reivindicação é aumento para o valor do piso da carreira de técnico do IBGE no valor de R$ 2.455,27.
e. alteração nos contratos dos Agentes de Pesquisa e Mapeamento (APMs) e Agentes de Pesquisa por Telefone, passando de renovação mensal para anual como forma de reduzir a precariedade dos contratos de trabalho que o IBGE põe em prática a Lei nº 8745/1993 (Dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público).
4- Garantia de autonomia técnica para IBGE, garantindo a manutenção da qualidade da informação, com devida conformidade com as normas, regras ou projetos, a verificação técnica da adequação dos meios aos fins propostos e de consistência das informações.
5 – Fortalecimento do papel do IBGE como coordenador do sistema estatístico, por meio da implantação do Sistema Nacional de Informações Oficiais. Atualmente o IBGE é formalmente o coordenador do Sistema Estatístico Nacional (Decreto-Lei nº 161/1967 e Lei nº 6.183/1974), mas não há base legal e institucional para que essa função seja de fato exercida. Para concretizar esse papel é fundamental que haja um diálogo permanente entre o IBGE e os demais órgãos do estado produtores de informações estatísticas e geocientíficas.
6 – Ampliação da base legal para acesso a registros administrativos. É fundamental que o órgão oficial de estatística – que garante o sigilo das informações, confirme previsto na Lei nº 5.534/1968 -, tenha acesso aos registros de órgãos públicos, proporcionando economia na coleta de informações e racionalização na solicitação de informações aos cidadãos pelo Estado, bem como conferiria mais qualidade às informações produzidas, tanto pelos registros administrativos, quanto pelo IBGE – permitindo melhor de pesquisas amostrais, verificação de cobertura, calibração de pesos amostrais, produção de estatísticas sem operações de coleta etc).
7 – Criação de espaços de escuta ativa da sociedade (Fóruns, Grupos de Trabalho, Câmaras Técnicas) sobre o escopo temático da produção estatística e geográfica e sobre as estratégias do órgão para fazer face a tais demandas.
8 – Democratização do órgão, com a implantação de planejamento do programa de trabalho com os trabalhadores, bem como o preenchimento de cargos de direção por processo eleitoral, como ocorre hoje em órgão como a FIOCRUZ e nas universidades públicas.
Em função do exposto, pedimos um compromisso com os pontos que constam nesta Carta. Ao mesmo tempo, a ASSIBGE-SN se disponibiliza quaisquer esclarecimentos.
Cordialmente,
Executiva Nacional da ASSIBGE-SN
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